PALMADA X PALMATÓRIA
Carta para amiga Dalva Franco
Estou acompanhando a polêmica sobre o Projeto de Lei 2.654/03, emenda ao ECA, conta a aplicação das chamadas palmadas dos adultos, como meio de coibir comportamentos indesejáveis em crianças e adolescentes, pelos boletins tão prestativos e permanentes do amigo Enéas.
É lamentável que políticos e notáveis venham à mídia para defender “uma palmadinha, que educa”.
Aqui em Timor Leste a coisa é mais séria, não temos palmada, temos palmatória.
Institucionalizada, enraizada na prática pedagógica, herança da educação luso católica.
Discutir o tema é difícil com os professores, justificam eles que: “Com o número de alunos que temos em sala de aula é impossível mantê-los disciplinados e atentos para aprender”.
Sim, algumas escolas da montanha o número de professores é insuficiente e desproporcional às necessidades da demanda de crianças que ingressam no sistema.
Gente se faz com mais facilidade e rapidez do que construir escola e formar professores.
A palmatória é o meio que estes pobres professores encontram para mostrarem quem manda em sala de aula.
Se no Brasil reclamamos que salas de alfabetização das séries iniciais com 40 alunos é um crime, indo contra nossos princípios de dignidade do exercício da profissão, aqui em Timor Leste temos salas com 50, 70 e até 100 alunos para um único professor.
Há situações que colocam o professor em verdadeiro desespero na atuação profissional. Como por exemplo a falta de um colega que terá sua turma distribuída para os demais, e não é justo dispensar uma criança que leva em média 30 minutos a 1 hora de caminhada pela montanha para chegar a escola.
Isto, 100 alunos de séries iniciais para um professor, leigo e despreparado para mudar algo na educação dessas crianças.
Não defendo a palmatória, apenas apresento aos leitores o quanto é difícil tirar da prática escolar algo que já é cultural.
Os pais apóiam, os professores agem mesmo sabendo que é errado mas concordam com a prática, foram educados assim. Pouco conseguiremos mudar na formação destes professores, eles também são impotentes como nossos pais, mães e professores do Brasil que defendem a palmada como meio de educar e impor respeito. Quantas vezes já não houvimos professores, graduados em nível superior dizer: "Esse(a) aí tá precisando que os pais dêem umas belas palmadas pra aprender a respeitar os adultos, é falta de apanhar", e pais dizendo aos professores: "Pode castigar professor(a) que esse(a) aí é triste, não obedece e não tem respeito, se der trabalho senta a peia, põe de castigo e me fala que depois em casa agente acerta!". Eu, nos meus vinte e quatro anos de magistério, já ouvi de colegas e de pais umas tantas vezes.
O problema é do governo sim em mudar costumes arraigados na cultura, que não deveriam nos acompanhar nessa época que estamos mudando o país, adquirindo auto confiança, respeito dos parceiros internacionais, aprendendo com os erros, vislumbrando um futuro de nação que tem muito a ensinar a outras.
Deste trabalho tiro uma lição: O Brasil ainda engatinha na questão de cooperação internacional. Não percebe as diferenças culturais contidas nos conteúdos dos materiais didáticos do Programa destoando da cultura local, somado a dificuldade de domínio da língua portuguesa.
O que precisamos é nos desdobrar na militância , não fugir ao debate, rebater veementemente aqueles que se valem da incapacidade e impotência de compreender a humanidade. Defendendo o direito da criança viver sem coação do adulto é obrigação moral e ética de todo profissional que pretenda se manter na esfera da educação.
Quem defende a palmada são os agessores, que substancialmnte precisam de uma atitude brutal e covarde para se impor perante a criança. Não sabem o valor de um NÃO. Quando crianças foram agredidos e não precisa ser muito inteligente para perceber que o comportamento recebido se repete na vida adulta. Acreditam que isto é normal, e desejariam a institucionalização da palmada, reguada, beliscada, puxão de orelha, chacoalhão, empurrão ou tapa na cabeça e no rosto, do banco e do chapéu de burro, do castigo no canto da sala virado pra parede, ajoelhar no milho ou em tampinhas de garrafa para educar crianças dentro dos muros das nossas escolas. Professor e pais não têm que ter autoridade, mas sim perversidade!
Porque assim, enterraremos o ECA, os direitos de proteção à mulher e ao idoso que já foram conquistados. Queimaremos em praça toda literatura que mencione o respeito a dignidade humana. Deixaremos de caminhar para frente e retroceder à idade média?
Deixaremos de apostar em nossa capacidade para o diálogo, entendimento, convivência pacífica?
Deixaremos de ser pais e professores amorosos e que respeitam nossos filhos e alunos para tornarmos os pregadores do medo e da indiferença com o próximo?
É assim estaremos preparando-os para a vida?
Timor Leste, a mais jovem nação do mundo, independente há 8 anos,mantendo tradições dos tempos de colônia.
Brasil, o país emergente do séc. XXI, 188 anos de independência, modernizando as mesmas tradições dos tempos de colônia.
Afinal, temos as mesmas matrizes luso católicas em nossas histórias.
Um forte abraço
Vladimir Petcov
Pedagogo e professor pesquisador
Professor Formador do Programa PROFEP Timor - MEC/CAPES Brasil
Dili - Timor Leste
Oi Amigo, li e reli a carta, e cada vez mais tenho certeza de que as estruturas do estado nacional(brasieleiro)e de outros paises, como Timor Leste por exemplo, precisam ser repensadas, com urgência, no que diz respeito a educação.E nós educadores que buscamos caminhos concretos para participar dessas mudanças não podemos perder as esperanças. Vamu que vamu.
ResponderExcluirAbraços,
Dalva Franco
Olá, bom dia!
ResponderExcluirPor traz desta questão da palmatória existe muito mais a ser discutido e na minha humilde opinião tudo tem haver com uma questão política envolvida. O Governo, sem ter como corrigir jovens infratores e as leis que são "mais brandas" por assim dizer, não os impedindo de cometerem crimes, justificam que as crianças e os jovens estão sendo criados soltos, sem limites. Mas não veem que tem uma questão hitórica de cada um. Se melhorar as condições basicas, da escola, do emprego, da saúde, da moradia, a família terá mais estrutura de educar esta criança nos moldes do ECA. Mas quando pais e professores defendem uma postura do castigo pelo castilo e um apoiando o outro, vem aquele velho conceito de que "Violência gera violência" e podem ter certeza que se não mudar o olhar de todos, nossas crianças e jovens vão reproduzir nas escolas, nas ruas e em suas vidas adultas tudo aquilo de que foram vítimas na sua infância. Educar dá trabalho e não é todos que tem esse compromisso com a Educação.
Por outro lado, acredito no futuro deste país apesar de seu caminhar ser lento, está sempre seguindo em frente.
Grata pela oportunidade.
Ana Lúcia - PMSP-Brasil